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nota a ti

às vezes isto de o meu cérebro ter que viver longe de ti entristece-me. começo a pensar na probabilidade de ter ficado sem um pedaço de córtex, consequência de uma das vezes em que me tentaste devorar. (felizmente sempre nos apercebemos a tempo de que apesar de teres lugar para mim entre os pulmões, jamais terias espaço para tudo o que eu tinha para te dizer e as tuas costelas acabariam por se partir duas a duas. quase que consigo ouvir. crac, crac.)
mas continuando. começo a pensar que se calhar uma das tuas dentadas me quebrou o crânio e depois talvez se tenha formado alguma espécie de fenda e eu tenha ficado com um nó de cérebro entalado na tal fenda. e talvez a pressão do osso tenha sido tal, que esse pedaço de cérebro se tenha desprendido do resto e caído no chão.
e eu aposto - APOSTO - que o vento o levou até uma qualquer estrada movimentada e que aí, depois de espezinhado, atropelado e quase esmagado, foi levado por um pássaro. um pássaro feio como a morte, com meia dúzia de passarinhos feios para alimentar no ninho. e eu estou em crer que esses passarinhos feios, que se alimentaram de mim, são os pais de todos os pássaros que agora existem. e estou em crer também que é por isso que agora tu não queres nada com pássaros e os pássaros não querem nada contigo. é porque o bocado que me falta, é o bocado que faria com que eu não quisesse saber de ti.

Carolina

para pôr dentro de uma garrafa de vodka

espero sinceramente que tenhas uma morte lenta e dolorosa como de resto tem sido este tempo em que te conheço. conheci.
não sei se tenho noção do que digo mas se não tenho não quero nunca ter (tido) porque a minha cabeça está cheia de bolhas de nada e a (in)existência de espaço mete-me numa situação complicada. não quero arriscar ter sangue a escorrer-me ouvidos fora ou ver a minha cabeça a ameaçar explodir - ou mesmo a minha cabeça a explodir - pelo simples facto de que sou demasiado preguiçosa para depois limpar os pedaços de cérebro, de memória, de ti que ficarem colados ao chão, às paredes e ao teto da caixa em que me encontro.
a verdade é que prefiro viver com a porcaria que criei/aste/ámos em vez de limpá-la permanentemente - ou sequer tentar - porque me cansei demasiado em demasiado pouco tempo e não tenho energia (ou vontade) para tratar disso/de ti agora.
neste momento só quero sentar-me aqui, a comer um pão com fiambre (ou outra coisa qualquer), enquanto te vejo sucumbir. e rir-me. rir-me enquanto tesouras invisíveis cortam todos os tendões de todas as partes do teu corpo. um por um. a começar nos tornozelos.
é a vida. era a vida.

Carolina

cassete

e, por mim, o mundo tinha acabado no instante em que me perdi entre as tuas mãos, por trás dos teus olhos, dentro de ti. por mim tínhamos ficado para sempre submersos no mar, tínhamo-nos quedado sufocando eternamente entre beijos e água nos pulmões, até que nos apetecesse respirar. e nunca nos ia apetecer respirar porque dentro de nós ninguém precisa de oxigénio e era aí que nós estávamos. sozinhos dentro de nós, dentro do mar. as ondas empurravam-nos de um lado para o outro e já nos sangravam as costas de tanto bater em rochas. mas não queríamos saber. íamos ser cadáveres vivos para sempre. íamos ser nada para sempre.
só que o mundo não quis acabar quando eu quis que acabasse e afinal o mar era só o cuspo gelado de um chuveiro. e as ondas? teus braços.

Carolina

não quero querer saber de rigorosamente nada

estava para aqui a analisar factos da (minha) vida e apercebi-me de que - acaso tivesse nascido uns anos antes - teria sido ótima companhia para o antónio variações, além. para além disso - e de outras coisas sobre as quais não me apetece escrever porque se me enfraquece a mão - tem-me corroído, qual banho de ácido sulfúrico, esta nova possibilidade de não "poder" gerar nada dentro de mim, para além de apatia, melancolia, agonia e outras ia. no fundo é poesia. tenho pensado que se calhar não me é tão indiferente quanto disse até aqui que seria. e torna-se mil vezes pior quando se ganha consciência de que nem é tanto pelo poder mas antes pelo dever. tenho pensado que se calhar tenho mesmo um demónio dentro de mim e que se calhar é mesmo melhor não o enfiar na boca de um bebé. tenho pensado que se calhar hei-de ser pouco mais do que isto, porque toda a gente nasceu para ter uma família e eu também devia ter nascido assim.

Carolina
blog? São ensaios cegos, lúcidos, físicos & metafísicos. É uma mente deteriorada e uma mão cansada. Ou incansável. Relógios parados. E sangue? (...) Mas sobretudo perda de tempo. E possivelmente mais qualquer coisa. Não sei. Incerteza também.

yeah, thanks

© 2010, Luna